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Foto do escritorMarcela Chanan

Um ateliê na escola para uma escola como um ateliê.

Por Marcela Chanan



Penso que todos os bebês e as crianças deveriam ter a oportunidade de viver um Ateliê em suas escolas, tanto um espaço físico que acolhe as explorações e o brincar, provoca investigações e nutre o senso estético, quanto a escola toda como um espaço de pesquisa, criação e experimentação para viver infâncias potentes por meio de múltiplas linguagens. Poderia começar a prática com a organização de um espaço físico para montar um Ateliê e depois levar esse 'estado de ateliê' para toda a escola: com muita curiosidade, corpos ativos e envolvidos em criar soluções para suas ideias; em relação com adultos, crianças, materiais e natureza.


A concepção de Ateliê que compartilho aqui não é uma sala de artes, onde cada criança senta no seu lugar e o professor direciona a proposta, todos fazem igual e ao mesmo tempo. Vamos transgredir essa prática tradicional e nos aproximar de laboratórios expressivos e criativos com as linguagens entrelaçadas, sem fragmentação. Crianças aprendendo com o corpo todo em ação, todos os sentidos, diversas possibilidades e ludicidade. Não há mais atividades de artes e sim proposições onde são os bebês e as crianças que dão sentido para as experiências.


Embora tenha aprendido a metáfora da escola como um ateliê, da cultura de Ateliê com a abordagem Reggio Emilia, também me inspiro em referências como Anna Marie Holm, Stela Barbieri, Edith Derdyk e vários outros artistas, além das minhas próprias vivências com múltiplas linguagens.


Você já se perguntou sobre o que é um ateliê?

Já conheceu algum ateliê de artista ou já pesquisou sobre?

O que será que artistas brasileiros falam sobre ateliê?


Conheço e acompanho algumas escolas brasileiras que fazem um trabalho bem interessante com ateliê, de acordo com seus territórios. Gostaria de ter registros fotográficos dos ateliês (espaço físico) dos quais vivi para colocar aqui, mas assim como na publicação sobre a sala referência, não fazia parte da minha prática fotografar os espaços. Por isso, pensei em uma inspiração que me agrada muito: o Ateliê Maria Brinca à Sombra, de Portugal, que nos apresenta a possibilidade de um espaço bem aproveitado, flexível, múltiplo em seus contextos e com materiais simples, nada que não esteja ao alcance dos nossos espaços educativos. Perceba não é um monte de armário e mesas coletivas cheias de cadeiras, é uma organização que demonstra outra concepção.


No ateliê como um espaço de pesquisa, conhecimento e experimentação, o educador é um mediador que prepara com intencionalidade o espaço e os materais para a exploração, faz boas perguntas e comentários que ajudam a criança a pensar; cria novas possibilidades, observa e escuta como a criança se relaciona com o espaços, os materiais e as pessoas, como acontecem os processos e as pesquisas. A partir destes interesses, projeta a continuidade das experiências com novos materiais e disposições para que seja significativo, desenvolvendo processos e percursos onde a criança produz sentido sobre o que experimenta, cria, imagina e investiga no coletivo e individual.


Embora na abordagem Reggio Emilia e nos espaços que dialogam com a cultura de ateliê exista o papel do Atelierista, são poucas as escolas brasileiras que atuam com esse profissional. No meu ponto de vista, na minha experiência e na realidade da escola pública da qual faço parte, o pedagogo faz esse papel. Por isso a importância de formação artística e cultural, rica em diversidade e múltiplas linguagens. Uma união de estudo, apreciação, reflexão e prática.


Em São Paulo e outras metrópoles é possível encontrar diversas posssibilidades de formação gratuita ou mesmo concorrer a bolsas de estudo em centros culturais e museus. Algumas ações básicas para começar: pensar sobre suas experiências estéticas desde a infância; priorizar cursos que unem teoria e prática; experimentar os materiais em casa ou na escola antes de oferecer para as crianças; informar-se sobre o educativo dos espaços culturais e museus (seguir as redes sociais, assinar a lista de emails etc); visitar exposições e ler sobre os processos criativos; assistir à espetáculos, shows, filmes e documetários; viver manifestações culturais; estudar sobre nossa cultura; ao viajar conhecer as tradições locais; entre tantas outras coisas.


Precisamos viver/sentir as propostas no nosso próprio corpo! Afinal, como saber sobre...*

desenho, se não desenhar?

dança, se não dançar?

argila, se não modelar?

pintura, se não pintar?

colagem, se não colar?

música, se não cantar/tocar?

poesia, se não poetizar?

natureza, se você não a adentrar?


*Escrevi inspirada por Pedro Bandeira em Vai já pra dentro, menino!


Podemos aprender as técnicas e uma linguagem de cada vez, mas devemos experimentar a articulação para aprendermos a articular, aprender com a arte contemporânea para potencializar o fazer docente e quebrar paradigmas no trabalho com arte e educação, expandir e ressignificar nossos saberes sobre arte. Quem sabe você descobre uma potência em si mesmo, se encanta por uma ou mais linguagens e se torna um professor-artista!?



Na perspectiva da escola como um Ateliê, o professor e as crianças são protagonistas, autores, criativos, capazes, autonômos de suas experiências. Um nutre o outro. Portanto, não exite cópia de propostas, não existe ver uma ideia no instagram e pensar "Vou fazer com as crianças!", essas práticas são reproduções com intenções superficiais. Podemos sim, nos inspirar e ver boas práticas, contextos, proposições e criar um repertório de ideias para colocar em prática quando dialogar com o contexto e principalmente com as pesquisas das crianças.


É preciso lembrar que embora projetamos, as crianças nos surpreendem com suas ações no encontro das crianças com os materiais, os espaços e as pessoas. Precisamos estar abertos a escuta, atentos durante a observação, inteiros para viver junto, curiosos por descobrir, assim vamos colhendo evidências do que pode se tornar potencial de aprendizagem.


Sobre os materiais, começamos com os recursos que temos disponíveis e vamos complementando com o que for necessário adquirir. Quero deixar claro, que não é preciso grandes investimentos e materiais caros para experiências incríveis acontecerem, mas sim precisamos de uma estrutura e de materiais de qualidade. Há que se fazer escolhas e composições que cabem no recurso financeiro disponível e fazer parcerias com a comunidade local para doação de materiais. É um compromisso da escola/gestão investir a verba com melhorias e compra/renovação de materiais e mobiliários e é um compromisso do professor cuidar desse patrimônio da escola e ensinar esse cuidado para as crianças. Temos muitos professores comprometidos que juntam e levam materiais de suas casas, inclusive compram quando a escola não cumpre o seu papel. O que não deveria ser assim, contribuir é sempre importante, mas todos precisam fazer a sua parte.


O espaço educa, então o ateliê precisa de uma estética e toda uma estrutura pensada dentro do projeto pedagógico, pois a altura e disposição dos mobiliários, a organização dos materiais, as cores do ambiente, a funcionalidade, a luz, a flexibilidade e tantas outros aspectos são importantes. Pensar um ateliê envolve estudar e refletir sobre:

  • a concepção de criança e de arte na infância;

  • como o bebê e a criança aprende;

  • os princípios éticos, estéticos e políticos;

  • os espaços, as relações, os tempos e as materialidades;

  • o direito a beleza;

  • a articulação das linguagens;

  • a observação, a escuta e a documentação;

  • o que é processo, o que é experiência, o que é criatividade;

  • diálogos entre arte e ciência;

  • as linguagens simbólicas;

  • a tecnologia e a natureza;

  • o papel do professor;

  • outras linguagens, expandir o conhecimento.

Defendo a existência de um Ateliê espaço físico nas escolas como propulsor de práticas que sustentem a cultura de Ateliê por todos os espaços da escola. Portanto...


Um ateliê na escola para uma escola como um ateliê é um convite para transformar a prática e as concepções. Contagiar toda equipe, começar do micro para o macro e descobrir a potência dessa perspectiva.


*Todos os direitos autorais do texto reservados para Marcela Chanan. É proibida sua cópia sem autorização prévia. É livre o compartilhamento da publicação na íntegra diretamente do blog (link e via redes sociais) e para impressão é ético colocar a referência.


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